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Entenda a importância do Vale Cultura na luta pelos games no Brasil


Foi-se o tempo da indústria de games no Brasil ser uma mera coadjuvante no mercado internacional. Com números cada vez mais impressionantes, não demorou para o Governo começar a entender a importância dessa mídia. Os desafios são imensos, a começar pela carga tributária excessiva, mas graças a iniciativas como o Jogo Justo e a luta de pessoas como Moacyr Alves, idealizador do projeto e conselheiro para a área de jogos eletrônicos no Ministério da Cultura, estes obstáculos, ao poucos, estão sendo superados. 

A primeira grande vitória veio em 29 de novembro de 2011, quando a portaria nº116 do Ministério da Cultura reconheceu os jogos eletrônicos como segmento cultural para recebimento de doações e patrocínios pela Lei Rouanet. Em outras palavras, games passaram a poderem ser financiados sob as mesmas regras que o cinema, o teatro, a música, dentre outras obras culturais. Essa conquista, inclusive, já teve seu primeiro beneficiado. Mas antes mesmo disso acontecer, surgiram alguns avanços dentro da própria Secretaria do Audiovisual, como o projeto de financiamento BrGames, ou mesmo no Ministério do Desenvolvimento, com a inclusão de jogos eletrônicos no segmento de audiovisual do Plano Brasil Maior.

Mas como toda boa guerra não é feita só de vitórias, o avanço dos games nas políticas governamentais esbarrou em um importante projeto: o Vale-Cultura. Segundo a atual ministra Marta Suplicy, "game não é cultura" e, portanto, não receberia os benefícios da iniciativa.

O que é o Vale Cultura?

É um instrumento idealizado pelo governo federal para garantir o acesso aos meios culturais disponibilizados no país. De maneira prática, serão R$50 mensais para o trabalhador que recebe até cinco salários mínimos gastar com cultura. Além do mais, é um benefício acumulativo, ou seja, o trabalhador poderá usar a sobra nos meses seguintes. Ele será disponibilizado preferencialmente por meio magnético, impossibilitando a troca do vale por dinheiro vivo. A verba utilizada para sustentar o vale vem de duas fontes distintas: até 10% deo valor (dez reais) viria de um desconto no salário do trabalhador, enquanto os outros 90% (quarenta reais) seriam pagos pelas empresas, que poderão usar esse valor para deduzir em até 1% de seu imposto de renda devido.

Quais são os benefícios?

Além da projeção de injetar 7 bilhões anuais na área de cultura no Brasil e atender por volta de um milhão de trabalhadores neste primeiro ano de implantação, o projeto ainda vai alimentar o mercado de produção cultural no país, beneficiando toda a cadeia produtiva: dos produtores, artistas e distribuidores até o consumidor final - inclusive ajudando a democratizar a cultura no país.

Porque os games se beneficiariam disso?

Aumentar o poder de consumo de games - sobretudo a uma parcela da população mais pobre que está acostumada com a pirataria e que agora vai poder investir este valor em jogos originais - vai injetar dinheiro no mercado formal de games, estimulando a indústria tanto de desenvolvimento (afinal jogos produzidos no país também se beneficiarão) quanto no mercado de distribuição deste tipo de mídia. Aí, surgem todas aquelas consequências básicas: geração de empregos no setor, fortalecimento da indústria perante o cenário internacional, etc. Este artigo fala disso de maneira mais aprofundada.


E porque a ministra é contra Vale Cultura para os games?

Em grande parte, por desinformação. Vamos reproduzir exatamente toda a fala dela durante o depoimento em que fez a afirmação de que game não é cultura. Esta resposta surgiu após o questionamento do pesquisador e designer de games Francisco Tupy, "O que o ecosistema que trabalha com jogos digitais, pesquisadores, desenvolvedores, professores etc pode esperar do Vale Cultura?"

“No caso dos jogos digitais, o assunto ainda não foi aprofundado o suficiente, mas eu acho que eu seria contra. Eu não acho que jogos digitais sejam cultura […] Mas a portaria é flexível. Na hora em que vocês conseguirem apresentar alguma coisa que seja considerada arte ou cultura, eu acho que pode ser revisto. No momento o que eu vejo é outro tipo de jogo. Encaminhem para o ministério as sugestões que vocês estão fazendo. Eu tenho certeza que talvez vocês consigam fazer alguma coisa cultural. Mas, por enquanto, o que nós temos acesso, não credencia o jogo como cultura. O que tem hoje na praça, que a gente conhece (eu posso também não conhecer tanto!) não é cultura; é entretenimento, pode desenvolver raciocínio, pode deixar a criança quieta, pode trazer lazer para o adulto, mas cultura não é! Boa vontade não existe, então, vocês vão ter que apresentar alguma coisa muito boa”.

Resumindo a declaração da ministra, a grande questão é que, para ela, os jogos eletrônicos "que tem hoje na praça, que a gente conhece" não passam de puro entretenimento, seriam um simples instrumento de "lazer para o adulto" e ferramenta para "deixar a criança quieta". Esse pensamento equívoco lança um debate importante, que é o centro da discussão sobre os jogos eletrônicos: game é cultura? A partir dessa resposta, os jogos eletrônicos finalmente poderão ser equiparados a outras mídias mais consolidadas - e livre de preconceitos - como o cinema e a música. Quebrar essa barreira dos games como algo além do entretenimento é o ponto chave para a realização de conquistas como o próprio Vale Cultura e, sobretudo, para a consolidação do mercado de games no país.

E como disse a própria ministra: "a portaria é flexível. Na hora em que vocês conseguirem apresentar alguma coisa que seja considerada arte ou cultura, eu acho que pode ser revisto". E será. 

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